Atividade física tornou o homem mais inteligente
Pintura rupestre de guerreiro da pré-história, do povo san, da África do Sul - Latinstock |
Quem descartar a meta de exercitar-se mais em 2013, considerando-a uma promessa impossível, deveria antes considerar uma teoria sobre a evolução humana que angaria cada vez mais adeptos na comunidade científica. Esta tese sugere que nossa inteligência hoje se deve, em parte, ao fato que, milhões de anos atrás, nossos ancestrais podiam fugir e correr distâncias maiores do que grande parte dos outros mamíferos. Ainda de acordo com esta hipótese, nosso cérebro foi moldado e se tornou mais apurado pelo movimento, e até hoje demanda atividades físicas para funcionar adequadamente.
O papel da resistência física no desenvolvimento da Humanidade intriga antropólogos e faz parte da imaginação popular há muito tempo. Em 2004, os biólogos evolutivos Daniel Lieberman e Dennis Brambel, respectivamente das universidades de Harvard e Utah, publicaram um artigo na revista “Nature” intitulado “A corrida de resistência e a evolução do Homo”, em que conjecturam que nossos ancestrais bípedes sobreviveram se tornando atletas de resistência, capazes de derrubar presas mais rápidas por pura teimosia, correndo e as caçando até terem sucesso.
Perpetuação dos genes
A resistência resultou em mais alimentos, produzindo energia para o acasalamento, o que significa que os primeiros corredores passaram adiante seus genes. Dessa forma, a seleção natural tornou o homem pré-histórico cada vez mais atlético, segundo Lieberman e outros cientistas. Seus corpos desenvolveram pernas mais longas, dedos menores, menos cabelos e complexos mecanismos de audição, funções que colaboraram na manutenção do equilíbrio e da estabilidade. Os movimentos, então, moldaram o corpo humano.
Ao mesmo tempo, em um desenvolvimento que, até recentemente, muitos cientistas não viam como relacionados à atividade física, o homem se tornou mais inteligente. Seu cérebro aumentou rapidamente de tamanho.
Hoje, segundo antropólogos, o homem tem um cérebro aproximadamente três vezes maior do que outros mamíferos de tamanho semelhante ao nosso.
Cientistas evolucionistas atribuíram este crescimento do cérebro a fatores como o consumo de carne e, talvez ainda mais importante, ao fato de que nossos primeiros ancestrais dependiam da interação social. O homem pré-histórico precisava planejar e executar caçadas em grupo, o que demandava pensamentos complexos que, quando bem-sucedidos, resultavam em uma recompensa. De acordo com esta hipótese, a evolução do cérebro foi uma consequência da necessidade de pensar.
Agora, no entanto, os cientistas sugerem que a atividade física também teve um papel crucial no crescimento do cérebro.
Para chegar a esta conclusão, os antropólogos analisaram dados já existentes sobre o tamanho do cérebro e a capacidade de resistência em vários mamíferos, como cachorros, porcos, raposas, camundongos, lobos, ratos, gatos e ovelhas. Notaram, assim, que havia um padrão. Espécies como cachorros e ratos, com uma capacidade de resistência grande e inata provavelmente desenvolvida ao longo de milênios, também contam com um grande volume cerebral, comparado ao tamanho de seus corpos.
Os pesquisadores também conferiram experimentos recentes em que camundongos e ratos foram sistematicamente submetidos a corridas de longa distância. Animais criados em laboratório que corriam voluntariamente, quando postos para cruzar, geraram filhotes corredores de boa qualidade.
Após muitas gerações, esses animais começaram a desenvolver de forma inata altos níveis de substâncias responsáveis pelo crescimento de tecidos e com boa repercussão na saúde, incluindo uma proteção chamada fator neurotrófico derivado do cérebro (BDNF, na sigla em inglês). Estas substâncias são importantes para a performance de resistência.
O que isso significa, segundo David Raichlen, antropólogo da Universidade do Arizona e autor de um novo artigo sobre a evolução do cérebro humano, que será publicado na edição deste mês da revista “Proceedings of the Royal Society Biology”, é que a atividade física pode ter ajudado a tornar o homem ainda mais inteligente.
— Acreditamos que nossos ancestrais caçadores-coletores mais atléticos e ativos sobreviveram e, como os camundongos de laboratório, passaram suas características fisiológicas ligadas à melhoria da resistência, incluindo níveis elevados de BDNF — explicou.
— Eventualmente, estes primeiros atletas acumularam tanto BDNF em seus corpos que ele migrou dos músculos para o cérebro, onde provocaram o crescimento do tecido cerebral.
Exercício apura habilidades mentais
O homem pré-histórico, então, aplicou sua crescente habilidade para o pensamento e a razão em melhores técnicas para conseguir suas presas, aumentando a disponibilidade de alimentos e tornando-se mais bem sucedidos do ponto de vista evolutivo. Estar em movimento os fez mais inteligentes, e, assim, permitiu que se movessem mais eficientemente.
— O principal ponto dessa nova teoria é que, se a atividade física ajuda a moldar a nossa estrutura cerebral, então provavelmente hoje ela continua essencial ao cérebro — ressalta John Polk, professor de antropologia da Universidade de Illionois em Urbana-Champaign, e coautor, com Raichlen, do novo artigo.
E há um suporte científico para esta hipótese. Estudos recentes mostraram, segundo Polk, que “exercício regular, mesmo a caminhada” leva a habilidades mentais apuradas, o que foi registrado da infância até a terceira idade.
A hipótese de que correr atrás da presa ajudou o homem em sua evolução cerebral ainda não foi confirmada, segundo Raichlen, e é quase impossível de prová-la. Mas Lieberman conclui:
— Acredito firmemente que existe uma sólida relação entre um corpo saudável e uma mente saudável — assegura, tornando a expressão “exercitar a memória” mais literal do que se imaginava.
REYNOLDS, GRETCHEN. Quem descartar a meta de exercitar-se mais. NEW YORK TIMES. Acesso em: 05/01/2013. Disponível em: http://oglobo.globo.com/ciencia/evolucao-do-cerebro-esta-ligada-pratica-de-exercicios-7168569
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